Gestão de Portfólio (Parte 2) – Trabalho Estratégico

Como vimos no nosso último post, para que possamos iniciar uma gestão de portfólio eficiente, precisamos iniciar classificando os tipos de trabalho e analisar quanto de esforço estamos despendendo em cada um deles.


Após esse primeiro passo dado, começaremos falando da gestão do trabalho estratégico. Mas antes de mergulharmos em ferramentas e processos, é necessário buscarmos a definição de estratégia, já que é uma das palavras mais mal utilizadas no mundo corporativo. Richard Rumelt, professor emérito da Anderson Business School e um dos maiores especialistas em estratégia empresarial, diz em seu livro The Crux – How Leaders Become Strategists, que “uma estratégia é um conjunto de políticas e ações desenhadas para superar grandes desafios. Não é um objetivo ou um estado final esperado, mas sim, uma forma de resolver problemas. E você não pode resolver problemas que você não entende ou compreende”.


Por hoje não entraremos na mecânica de como definir uma estratégia, mas espero que a frase de Richard te faça pensar um pouco de como está definida a estratégia da sua empresa, do seu produto ou das suas metas de ano novo.

Agora que já temos em mente a definição de estratégia, vamos ao que interessa. Lembram do livro EDGE – Value Driven Portfolio Management que citamos no post anterior? Ele também traz uma ferramenta que vem crescendo em utilização dentro das empresas para gestão do portfólio estratégico, chamada Lean Value Tree.

Lean Value Tree

A Lean Value Tree é uma árvore, pois todos os “ramos” partem de uma visão organizacional. É lean, porque todo o trabalho é quebrado em pequenas partes capazes de serem priorizadas. E é totalmente focado no valor a ser gerado para o cliente. Aí foi só juntar tudo para criar o nome da ferramenta e reduzir apenas para o acrônimo: LVT.

 

A LVT foi pensada para colocar o cliente e suas necessidades no centro da estratégia e adicionar métricas de contenção para analisar os benefícios para a empresa em conjunto. Também uma estrutura única (!!!) para a empresa e devemos evitar com que 2 ou mais convivam em um mesmo negócio. O motivo é simples, priorização! Como irei saber onde investir se cada uma das estruturas direciona a empresa para um lado? Isso dispararia um canibalismo estratégico prejudicando o resultado no investimento realizado.

 

A LVT possui quatro níveis em sua estrutura: Visão, Objetivos, Apostas, Iniciativas. Essa estrutura permite uma gestão de forma visual dos investimentos que estão sendo feitos em cada um dos níveis e quais resultados são esperados em cada um deles. Esse formato de orientação à validação de hipóteses faz com que 1) Tenhamos em mente que não conseguimos adivinhar o futuro e temos apostas baseadas em informações e 2) Foquemos no resultado que estamos tentando atingir com aquele investimento ao invés de focar nas entregas que temos que realizar. Caso uma aposta não se concretize, basta analisar os aprendizados e decidir entre continuar investindo ou pivotar para uma nova.

Vamos então falar de cada um dos nós e analisar como eles se relacionam.

  • Visão: ela dita todo o direcionamento da empresa e onde ela se enxerga dentro dos próximos 3 ou 5 anos. Tem uma longa duração e busca ser arrojada e inspiradora. Ex: Ser a principal escolha dos jovens brasileiros de 18 a 28 anos ao investir o seu dinheiro

  • Objetivos: ponto da árvore que define, com clareza, o que se espera atingir para entregar a visão da empresa. Tem duração de 1 ano na maioria dos casos, mas pode ser adaptado de acordo com o contexto da empresa. Ex: Habilitar 25% dos clientes com cadastro aprovado a realizar o primeiro investimento.

  • Apostas: representa as hipóteses geradas para um determinado objetivo. Essas hipóteses têm duração média de 6 meses. Ex: Dar um crédito de R$50,00 para realizar o primeiro investimento.

  • Iniciativas: com a estratégia representada pelos nós acima, a iniciativa foca em entregar e gerar o valor esperado aos clientes. Possui duração de 3 meses em média. Ex: Funcionalidade de recomendar melhores investimentos até R$50,00 com base no perfil do investidor.

Todos os níveis são revistos de forma contínua, podendo persistir com os investimentos, pivotar ou, até mesmo, ser encerrado de acordo com os resultados obtidos. Falaremos disso um pouco mais a frente na sessão de Governança. Agora é hora de entendermos como financiar e capturar resultados na LVT.

Financiamento e Resultados

Para que a estratégia seja flexível e se adapte às necessidades dos clientes e, consequentemente, do mercado, um mecanismo de financiamento e resultados é acoplado à LVT.

 

Cada nó da sua estrutura tem um determinado investimento de acordo com o resultado esperado. Esse nó, por sua vez, divide esses investimentos em seus nós filhos, gerando um sistema aninhado. Por exemplo, se eu recebo R$ 100 mil para o meu objetivo de “ativar 25% dos clientes com cadastro aprovado, eu terei que dividir esse dinheiro em apostas como a de “dar crédito de R$ 50,00 para realizar o primeiro investimento” e outras apostas irmãs que acredito que irão gerar resultados. Essas apostas, por sua vez, deverão usar o mesmo sistema para distribuir dinheiro entre suas iniciativas. Cada nível da árvore deve ter autonomia para alocar seus investimentos. Caso contrário, uma estrutura rígida pode se estabelecer e eliminar as vantagens da LVT.

Os resultados funcionam de forma similar, porém em fluxo reverso. Enquanto os investimentos estão aninhados de cima para baixo na LVT, os resultados se acumulam debaixo para cima. As iniciativas contribuem para os resultados das apostas e as apostas contribuem para os resultados dos objetivos. Toda essa estrutura combina esforços para atingir a visão. Assim temos um sistema interligado que permite rápida avaliação de resultados e evita o desperdício de investimento com base no que foi obtido.

Governança

Nesse ponto você deve estar se perguntando: mas quais papéis são responsáveis por cada nível da estrutura? Como faço para revisar meus resultados e investimentos? Na LVT trabalhamos com um conceito de governança leve. Leve no sentido de não ter um monte de parafernálias para analisar algo que deveria ser simples e fluido. Por isso, leve!

 

Para cada um dos nós da árvore, teremos pessoas – ou um time de pessoas – responsável por 1) investir o dinheiro e 2) analisar os resultados. O dono da Visão sempre será o CEO com o respaldo de seus conselheiros para determinar a direção da empresa. Para os objetivos temos o “Dono do Objetivo”, para as apostas temos o “Dono da Aposta” e para as iniciativas temos o “Dono da Iniciativa”. Essas pessoas escolhidas devem ter o poder de decisão sobre os nós filhos e estar focadas para extrair o maior resultado possível de seus investimentos.

Na captura de resultados teremos um ciclo aninhado, como visto antes. na figura abaixo podemos ver um exemplo de modelo frequentemente usado nas empresas.

Agora temos tudo no lugar para começar a implantar a LVT na nossa empresa, basta apenas sabermos como definir as métricas de sucesso de cada um dos nós da árvore.

Métricas de Sucesso

Exceto para a visão, que terá um ciclo de revisão bem mais longo, cada nível da LVT possuirá uma métrica de sucesso – measure of success, em inglês – ou, simplesmente, MoS, para cada nível da sua árvore. Elas capturam o valor que esperamos gerar para o cliente. Percebam que no objetivo de exemplo “habilitar 25% dos clientes com cadastro aprovado a realizar o primeiro investimento” centramos a métrica na necessidade dos jovens de dar o primeiro passo nos investimentos mais do que o benefício que gerará para a empresa. Poderia ser algo como “aumentar o faturamento em 10%”. Focar na cliente não significa transformar a empresa em uma ONG. Apenas deixamos estas métricas como guardrails, para que o benefício gerado à empresa também seja capturado, analisado e redirecionado, se necessário. Com a percepção de valor do cliente, os resultados financeiros acontecerão na mão de bons gestores.

 

A LVT utiliza métricas de sucesso para definir e acompanhar o valor gerado pela entrega de iniciativas. Quanto mais ao topo da árvore, mais as métricas demoram – ou se atrasam – a produzir algum resultado. Para elas damos o nome de métricas lagging. Os nós de objetivos e apostas utilizam essas métricas para acompanhar o sucesso, pois levam um tempo maior para serem validados. E quanto mais nos aproximamos das iniciativas as métricas geram resultado mais rápido que indicam que estamos no caminho certo de atingir os objetivos no topo da árvore. Estas métricas levam o nome de leading. Ou seja, métricas leading indicam o direcionamento para atingir as métricas lagging.

Também possuímos métricas de atividade que, como o nome sugere, apontam a eficiência da execução das tarefas. Logo, velocidade,  lead-time, cycle-time, tempo médio para recuperação de falhas (MTTR), quantidade de deploys realizados na semana, são exemplos usados para esse tipo de métrica. Alerta de spoiler! Em equipes com disfunções de alinhamento com a empresa, é comum vermos estas métricas como as únicas a serem medidas.

Conclusão

No mundo dinâmico em que vivemos – alguns dizem BANI e outros ainda dizem VUCA – a LVT é uma ferramenta poderosa para melhorar a qualidade dos investimentos realizados e adaptar e aprender sobre os resultados que estamos tendo. Isso reduz o custo de desperdício de construir o que não se deve construir e consegue fazer com que a empresa seja mais competitiva ao atender melhor aos seus clientes ou identificar novos mercados.

Neste post pudemos ver sobre como gerenciar o trabalho estratégico de uma empresa utilizando esta ferramenta. Passamos pela estrutura da árvore, fluxos de financiamento e resultado e métricas de sucesso. Com todos os elementos em seu lugar, deveríamos ter cartões preenchidos de nossa LVT de acordo com o exemplo abaixo.

Agora determine a frequência de sua governança e comunique a todos os envolvidos. Tenha disciplina para revisar e adaptar com frequência e tenha transparência para evoluir e melhorar sua árvore à medida que avança com o modelo.

 

Certamente o mapa não é o terreno e cada empresa tem suas peculiaridades, sua cultura, seu contexto e suas pessoas. Por isso, juntamente com a adoção da nova ferramenta e das novas práticas, é necessário um plano de gestão da mudança para que o valor não seja apenas pelo seu uso, mas pelos resultados que ela pode trazer.

No próximo post falaremos sobre a gestão de business as usual, ou BAU. Fique atento a esta série e deixe seu comentário sobre insights, dicas e sugestões. Até lá!

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